sexta-feira, 14 de setembro de 2007

A Dália Negra


A Dália Negra (revisão) é mesmo um dos maiores De Palma, por mais que se fale em "assimetrias" a respeito dele. Durante o filme todo perguntamos o que é realidade e o que não é, enquanto o protagonista passa a ter consciência de que se move em um mundo de aparências. Então, onde está a verdade (não à toa, muitos movimentos de câmera são puro Orson Welles)?
A personagem de Scarlett Johanson é um simulacro, uma figura, um traço apenas, que está ali para nos remeter a uma figura feminina de um noir que não existe mais. E De Palma nos leva a perguntar se ela é mesmo real, se é legítima, pois ao final, depois de passar por tantos labirintos de aparências, o herói só terá a ela.
Bem, por outro lado, ela é Hollywood (se remete ao noir) e o filme se desenvolve no sentido de nos mostrar o outro lado da indústria, de Hollywood, terra das negociatas e das perversões.
Há muito sarcasmo crítico nesse filme que relaciona esse "mundo de irrealidades" a um palhaço deformado, que é o quadro que aparece várias vezes na casa dos milionários e no local do assassinato. Inclusive, nesse local o palhaço aparece meio desmanchado, as tintas de sua figura se confundindo com o sangue do assassinato, marcando o humor negro de De Palma (o sarcasmo mais a melancolia do palhaço). E ele nos fita como ocorre na obra de arte moderna, é ele que nos vê, que vê esse grupo social, essa indústria.
Mas e o espectador, onde fica? Ele está ao lado do protagonista que começa pueril e termina o filme sem saber o que pode haver de real, de verdeiro nesse mundo. Scarlett Johanson é o que lhe resta, mas será Scarlett apenas mais um filme (até porque o que ele descobre sobre ela e seu amigo é que eles eram cúmplices em um crime) um mero simulacro que emula o noir? Uma amante ou uma amiga? Uma mulher? Será que ainda é possível descobrir algum sentido, alguma verdade em Los Angeles, em Hollywood?
Ou bem De Palma é o próprio palhaço melancólico, que sabe que somente travestido de palhaço pode fitar aquilo tudo. É necessário se passar por palhaço, se instalar como obra moderna nos bastidores da indústria, fitando com expressionismo o filme, nossas consciências pueris, mornas, para só então nos devolver para a heroína.
Portanto, é aqui que fica o espectador. Como o protagonista, ele é aquele que terá agora e urgentemente de dialogar com o simulacro de heroína (o final do filme), ou seja, com a obra de arte,com a indústria e Hollywood, assim como o diretor em suas barroquices.

Alessandro Coimbra

Um comentário:

Maenis disse...
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